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Cannabis, gentrificação, meditação – e carne

O SouthBites (a trilha sobre comida do SXSW) desse ano foi uma grande decepção pra mim


16 de março de 2016 - 8h11

Fui assistir, cheia de felicidade, um painel que se chamava “How do We Get Billions of People to Eat Less Meat” – e saí frustradíssima. Uma das participantes, a historiadora Rachel Laudan, até trouxe alguns pontos interessantes: sobre a relação da carne com o poder – historicamente, ricos comem carne e pobres comem batatas – e ao questionar o título da palestra. Quem somos “nós” e que direito moral temos de querer que bilhões de pessoas comam menos carne? A discussão não foi aprofundada, no entanto.

Isha Datar, representante da New Harvest (uma organização que fomenta pesquisas sobre agricultura celular) também fez uma boa intervenção, ao levantar a bola de que a carne é barata por causa dos subsídios governamentais. Segundo ela, não sabemos mais qual é o verdadeiro preço da carne (mas certamente não seria tão barata sem os subsídios). De acordo com Isha, se a carne in vitro fosse subsidiada, os frigoríficos poderiam deixar de ser fábricas de morte e tortura e migrar para a produção de carne feita de células autônomas, sem mães. Porém, mesmo ela foi super moderada – afinal, precisa chamar a atenção da opinião pública e gostaria muito que a indústria alimentícia fosse aliada nessa mudança.

No fim, ninguém estava ali para questionar nem a necessidade de comer carne e produtos animais, nem as implicações morais disso. Eddie Garza, da Humane Society, mostrou um discurso coerente com a sua organização bem-estarista (que não se opõe à matança e escravidão de animais, apenas advoga um tratamento humano antes da morte) e não trouxe absolutamente nenhuma contribuição digna de nota a não ser um sorriso conciliador. Ninguém quer passar por radical. Deixa isso para os abolicionistas.

Nenhum deles foi convidado para o painel.

Depois disso teve uma palestra chamada “In Defense of Big Food”. Como as grandes empresas alimentícias estavam ajudando a acabar com a fome do mundo, aumentando os direitos dos trabalhadores e diminuindo o desperdício de comida, blabla. Bem, o que eu podia esperar de um evento patrocinado pelo McDonalds?

(Depois de cinco anos vindo para Austin, talvez tenha chegado a hora de achar outro SXSW. Burning Man? Provavelmente já estou uns 20 anos atrasada pra esse também).

Enfim. No último dia eu cansei de procurar a redenção e de correr atrás de palestras de design e futurismo. Assisti um painel sobre cannabis medicinal (que tinha entre os debatedores uma cientista de Stanford), depois ouvi parte da apresentação de um moço da Huge sobre o estudo da gentrificação a partir de dados demográficos, e por fim fui ver Andy Puddicomb, dono do meu app queridinho do momento, o Headspace. Ele fez o salão inteiro meditar por 10 minutos, em uma versão ao vivo das meditações guiadas do app.

Já cansada de ouvir tanta gente falando tanto, devo admitir que dormi.

Alessandra Nahra é arquiteta de informação e sócia da consultoria de UX Saiba+

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