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Wrap up do Bruce Sterling e dos postes de Austin

Melhor deixar o mundo para os robôs mesmo


15 de março de 2017 - 14h24

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A primeira coisa que vi quando cheguei perto do centro de convenções de Austin foi que os postes todos estavam envelopados com plástico. Uma espécie de papel filme em volta de todos os postes, todas as latas de lixo, em todos as colunas do prédio. Que que eu posso fazer? Uma das coisas que mais gosto é ficar olhando para o mobiliário urbano de outras cidades e sonhar com o dia em que São Paulo comece a investir mais em qualidade. Cada um com suas manias.

O plástico é uma forma de manter a cidade livre das centenas de posters, de stickers e de todo tipo de propaganda dos keynotes e eventos do SXSW. Engraçado que uma turma tão digital ainda tenha que recorrer ao papel colado em postes para chamar a atenção. No app oficial do SXSW estão todos os eventos e talks, mas nada bate um bom poster. Algum “town hall meeting” deve ter se revoltado com a sujeira nos postes pós-evento e resolveram tomar uma atitude. Aí rolou o wrap up dos postes como na foto ali em cima.

Outro wrap up importante foi o discurso de Bruce Sterling. Aparentemente, já se tornou uma tradição do South by, como ele chama o evento. Um discurso de um hora cravada. Um dos melhores textos que tive o prazer de ouvir por aqui. Bem amarrado e eloquentemente ensaiado para uma plateia gigante no maior auditório por aqui.

Ele, que é jornalista e escritor de ficção científica, um dos fundadores do gênero cyberpunk, é conhecido por criar neologismos. Por provocar a audiência techno-lover com contrapontos e botar a gente para pensar. Desta vez, ele mirou seu canhão discursivo comicamente mau humorado para o fim do emprego, para a vitória dos robôs sobre a humanidade e sobre o UBI.

Aí você me pergunta: o que é UBI?
UBI é universal basic income. Renda mínima universal. Isso. O Suplicy estava certo.

Este é o grande assunto por aqui. Os robôs vão acabar com 35% dos empregos em 10 anos. Com mais de 70% em 20 e por aí vai. Estamos perto de eliminar o modelo capitalista que conhecemos. O modelo escola-faculdade-emprego-aposentadoria está perto do fim. Ninguém mais vai ter empregos convencionais, já estamos vivendo o início da “gig economy”. Você faz uma coisinha aqui, outra ali e ganha o seu dinheirinho. O restante vem do UBI. Será?

O neologismo da vez foi sobre o fim do proletariado. Da galera que trabalha das 9 às 6. Nas palavras de Sterling: “the proletariat is turning into the unnecessariat”. A nossa ânsia de automatizar tudo e todos os processos está nos tornando obsoletos. O fim do emprego quer dizer mais horas de lazer para todos? Quer dizer que vamos voltar para o Jardim do Éden? Lembre-se que quando fomos expulsos do paraíso, uma das penalidades foi a de ter que trabalhar, de arar a terra para ter o que comer. Parece que os robôs vão finalmente dar um jeito nisso e vamos voltar ao Éden. Será?

Sterling é ácido demais para achar que robôs significam o ócio idílico para a gente. Estamos colocando os robôs em posição de protagonismo. Vamos viver o peso do mundo pós-humano. Vamos deixar estas máquinas tomarem conta de tudo e vamos fazer o que? Nos matar? Partir para outros planetas intocados? Espiritualismo? Religião? Lembre-se de que robôs são todos ateus. Se deixarmos o mundo para eles. Se partirmos, eles não vão criar um mundo distópico, não vão nos colocar em casulos para gerar energia. Eles simplesmente vão se desligar.

Robôs não são capazes de perceber a beleza da vitória sobre os humanos. Essa é a diferença fundamental. Eles não têm apetite. Não são suicidas. Se desligarão porque é a opção mais racional.

Ufa. Papo cabeça demais. Era o que eu esperava ouvir quando pisei em Austin. Fiquei de queixo caído enquanto as pessoas aplaudiam o escritor de cyberpunk com cara de cantor de country music.

Bruce Sterling vai para a minha galeria das coisas mais legais de Austin.
Espero vê-lo de novo em 2018. E esse plástico todo em torno dos postes? Serão que vão todos para o lixo? Que desperdício. Melhor deixar o mundo para os robôs mesmo.

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