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SXSW é sobre isso!

Sabe aquela sensação de tudo embaçado e, de repente, a vista clareia? O “South By” (nome carinhoso do evento) faz isso com nosso olhar


16 de março de 2022 - 10h14

Crédito: M&M

Alguns dias antes de vir para o SXSW, eu fui ao oculista. Sabe aquela sensação de tudo embaçado e, de repente, a vista clareia? O “South By” (nome carinhoso do evento) faz isso com nosso olhar. Os primeiros dias deixam tudo confuso, bagunçado e, aos poucos, cada letra, cada conceito assenta e começa a fazer sentido. E conceito não significa necessariamente palestra ou painel. Estamos falando de insights que a gente vai guardando pelas ruas, arquivando nas conversas de bar, colecionando nas frases anotadas, até que as sinapses começam.

“Coletar os pontos pra conectar os pontos” foi uma frase que ouvi na minha primeira vinda e uso para a vida toda. Poder viver esse tipo de experiência é algo mágico e de agradecer aos céus. Aposto que a grande maioria dos mil brasileiros presentes aqui já está pensando onde vai se hospedar em março de 2023 e quantos amigos vai conseguir trazer consigo.

Chegamos todos com a emoção à flor da pele, afinal, encontrar tanta gente, depois de tanto tempo de isolamento, é de arrepiar. Já na abertura, chorei ao ouvir a facilitadora e mediadora de conflitos Priya Parker dizendo: “Olhem ao seu redor, estamos em Austin, juntos. Conversem com outras pessoas agora, aproveitem a presença física, interajam”. Os corpos enferrujados começaram a se mover, ainda tímidos, e a visão embaçada com tantos estímulos do ao vivo. A brasileira com quem conversei vinha pela primeira vez e já se mostrava ofegante e ansiosa para saber como aplicaria o que veria no evento. “Não. SXSW não é sobre isso. Relaxe e colete os pontos”. Que mania a gente tem de buscar sentido nas coisas o tempo todo, né?

Depois veio Scott Galloway com uma metralhadora poderosa de previsões para o futuro e, pá! Foi surpreendido, no final de sua palestra, quando um homem questionou sobre suas postagens fantasiado de mulher. Ele é pai de uma menina transgênero e disse ser uma postura ofensiva e perigosa por fomentar o bullying. Sem palavras, o aclamado Prof G. foi desafiado a rever suas perspectivas e, emocionado, disse que não faria mais isso: “I will stop”. Só esse momento já renderia um artigo à parte. Mas SXSW não é (só) sobre isso.

No dia seguinte, no workshop sobre ESG (Radar da Antifragilidade), guiado pelas brasileiras Tipiti Barros, Erlana Castro e Sabina Deweik, ouvi sobre a importância do autoconhecimento e do ativismo das corporações. Afinal, qual o nosso papel enquanto seres humanos e organizações na tentativa de salvar o mundo? O mesmo mundo que Amy Webb disse estar em caos, com suas previsões muito bem embasadas e mais apocalípticas do que se pensava: “se você acha difícil gerenciar suas senhas, imagine ter que gerenciar diferentes versões de você no metaverso”.

Depois foi a vez da favela ganhar o palco do SX, com Edu Lyra (Gerando Falcões) e Eco Moliterno (Accenture Interactive) colocando a plateia pra pensar nos desafios de vencer a miséria no Brasil e convocando Elon Musk: “Nós vamos mandar a miséria para o espaço antes de você colonizar Marte. Quer me ajudar nessa, Musk?”, desafiou Lyra.  

A polarização no mundo também ganhou a cena e me fez pensar que consumimos muito mais notícias dos extremos porque os de centro se manifestam menos. Cara, como isso é óbvio! E como disse Tristan Harris sobre a responsabilidade das plataformas: “a tecnologia tem que sair do lugar de neutra para apoiar a justiça”. Rohit e vários outros palestrantes falaram sobre a dificuldade de atrair atenção, de distinguir o relevante do irrelevante e do poder da presença, a mesma presença que a Priya conclamou na abertura. A produtividade e o futuro do trabalho também foram o centro de diversos debates, mas trazendo novas perspectivas. “Muitos dos projetos mais inovadores do Google surgiram por conta do tempo livre que demos aos nossos engenheiros”, disse Ann Haitt, leadership strategist na Hipergiant.

Web 3.0 e a descentralização da web foram temas frequentes, também. Metaverso e NFT (Non Fungible Tokens) vieram com força, oscilando entre queridinhos e desacreditados. Mas o SXSW não é sobre isso!

É sobre a palestra que você perde e termina num café com estranhos discutindo novos modelos de maternidade. É sobre o show em que você chega sem expectativa e de repente coloca um russo e um ucraniano cantando juntos com a bandeira da paz. É sobre o almoço na grama sintética da ativação da Amazon com negras plus size brilhando no palco. É sobre cruzar o rio de patinete, se sentindo livre e poderosa, para visitar uma feira de bem-estar. É sobre fazer amigos de infância e dançar no duelo de pianos do Pete’s até o bar fechar e nem perceber que o tempo passou. É sobre conseguir a reunião que você estava tentando há meses na correria de São Paulo e nem chamar de reunião. É sobre o jantar em que cada um conta o que viu de bom sem FOMO, com generosidade. É sobre a caminhada em que você descobre uma exposição de arte imperdível ou o happy hour para o qual você consegue acesso e celebra feito adolescente.

Isso tudo me lembra um insight da palestra da Amy Webb em que ela mostrou uma imagem e perguntou: “o que vocês veem aqui”? As pessoas não conseguiam enxergar nada até que ela mostrou um contorno, e todos passaram a ver a foto de uma vaca. Assim, comprovou que nosso olhar está adaptado a ver os espaços “preenchidos”, e que é justamente olhando para os “white spaces” que a gente percebe o que está lá. SXSW é sobre isso! Reperception: calibrar nosso olhar para ver o mundo de um outro jeito, em que os espaços em branco são cheios de significado.

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