Meio&Mensagem
Publicidade

A ciência por trás de Pantera Negra e dos filmes de herói

Reunidos em um painel do SXSW, pesquisadores e roteiristas de Pantera Negra e Guardiões da Galáxia falaram sobre a participação da comunidade científica na construção das narrativas audiovisuais

Karina Balan Julio
12 de março de 2018 - 11h01

Em maior ou menor grau, a ficção se apropria de tecnologias “fantasiosas” para dar vazão às histórias. Os filmes de super-herói, donos das principais bilheterias de cinema ano após ano, sob um primeiro olhar podem parecer ter pouco fundamento científico, mas escondem conceitos e tecnologias reais presentes no cotidiano de pesquisadores e cientistas.

“Quando eu era criança, as histórias de super-heróis não tinham uma conexão com a vida real. Nos últimos anos, se tornou muito importante que haja algo tangível e científico que seja base para poderes ou ferramentas sofisticadas que os heróis usam”, contou Rick Loverd, diretor do programa de ciência e entretenimento da National Academy of Sciences, nos Estados Unidos, em painel com os roteiristas de Pantera Negra e Guardiões da Galáxia, e com o pesquisador da University of Souther California, Clifford Johnson.

Painel com Joe Cole, roteirista de Pantera Negra. Foto: Karina Balan

No último sábado, 10, eles se reuniram para falar sobre os processos para construir narrativas minimamente tangíveis em filmes derivados de quadrinhos e com temática tecnológica. Desde 2008, o programa da National Academy of Sciences já prestou consultoria para mais de 1900 projetos audiovisuais, incluindo Iron Man 2, Thor, Avengers, Pantera Negra e Star Trek.

“Para nós roteiristas, esse tipo de iniciativa é uma oportunidade de falar com as pessoas que estão realmente fazendo as tecnologias que tentamos imaginar. Você quer que a história tenha pé no chão: mesmo que for sobre aliens ou robôs, precisa ser algo que pareça verossímil na ficção e que tenha um pé na realidade. É bom ter alguém para vetar aspectos do seu roteiro antes de ele ir para frente”, disse Joe Cole, roteirista de Pantera Negra.

Para a produção do filme, que até então já superou a marca de US$ 1 bilhão em bilheteria ao redor do mundo, a equipe de roteiro e pesquisa teve apoio de especialistas para pensar desde a roupa dos personagens até as tecnologias presentes em Wakanda, cidade onde se passa a trama.

“Uma das preocupações que tivemos para o filme foi em pesquisar sobre as culturas indígena e africana e sobre os materiais que utilizam no cotidiano. Na história, a nanotecnologia presente na roupa de T’Challa é construída com areia, por exemplo, pois faz mais sentido do que usarmos outro material desenvolvido na cultura ocidental”, explicou.

Lugar de fala aos cientistas

O pesquisador Clifford Johnson trabalha para ajudar artistas, cineastas e produtores a incorporar ciência a seus processos de storytelling. Ele é especializado em temas como gravidade quântica, buracos negros, a origem e evolução do universo e a relação tempo x espaço, assuntos recorrentes em filmes de super-herói e ficção.

“Muitos roteiristas ou produtores já chegam com um script mais ou menos pronto e estão apenas procurando por buzzwords ou checagem de fatos. A melhor experiência na minha opinião, mas que ainda é exceção, é quando me chamam para trabalhar juntos aos roteiristas desde o início, com envolvimento profundo no roteiro e nos arcos dos personagens”, pondera. Clifford foi consultor em produções como Agent Carter e Star Trek.

Ele acredita que retratar temas científicos com responsabilidade pode ainda encorajar crianças e jovens a trabalhar com tecnologia e pesquisa. “Pode ser que alguém veja o filme, conheça um conceito e ‘dê um Google’ depois”, diz. Para ele, muitos poderes hoje vistos como absurdos tendem a se tornar realidade com o avanço da indústria protética e aplicações integradas ao corpo com tecnologias de IoT e inteligência artificial.

“Apesar da precisão das informações, às vezes acho menos importante pegar todos os detalhes científicos corretamente do que transmitir lições maiores nas produções. É mais poderoso mostrar o processo científico e a forma com que cientistas abordam um problema do que usar um nome correto, necessariamente. Os nomes técnicos mudam o tempo todo, enquanto o processo científico é atemporal”, explicou.

O fim do gênio solitário

Outro mito da ficção é retratar os cientistas como “gênios iluminados”, de acordo com os especialistas, já que, na vida real, o desenvolvimento de tecnologias e grandes descobertas é muito demorado e mais colaborativo do que se imagina. “O mito do gênio sozinho é muito prejudicial para as próximas gerações”, disse Nicole Pearlman, roteirista de Guardiões da Galáxia.

“A história de retratar o gênio como um super-humano quase mágico desencoraja pessoas a se interessar pela ciência, pois elas acham que precisam ser igual a Einstein. Mostrar uma pessoa como o gênio que revolucionou tudo é um desserviço a como a ciência realmente funciona”, acrescentou Clifford.

Publicidade

Compartilhe

Patrocínio