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O tom certo

O SXSW propõe discussões conceituais a respeito da música e do seu uso, tornando relevante para qualquer um que aprecie e use a música em sua vida pessoal e profissional


16 de março de 2018 - 11h48

Com a proximidade do final, o Festival é invadido pela música. Palcos que vão de pequenos bares a grandes áreas de show. Mas é injusto dizer que o SXSW trata a música apenas como entretenimento. Há palestras técnicas, painéis de negócios, meeting entre artista e produtores. Além disso, o SXSW propõe discussões conceituais a respeito da música e do seu uso, tornando relevante para qualquer um que aprecie e use a música em sua vida pessoal e profissional. E o que me surpreendeu ontem foi exatamente um painel que tratava a música de uma forma bastante especial e delicada.

O projeto Heart and Soul há décadas usa a música como forma de inclusão, desenvolvendo programas com pessoas que possuem algum tipo de condição especial, tal como autismo ou síndrome de Down, e partindo do princípio que todos os seres humanos querem mais do que ser cuidados e tratados e que precisam desenvolver sua forma de se expressar e se desenvolver como um ser único. Ao longo desses anos, diversas pessoas puderam usar a música em seu dia a dia. Algumas apenas como lazer e outras levando bastante a sério.

Foi o caso da Banda Fish Police. Formada e liderada pelo sensacional Dean, que estava presente ontem no painel junto com o fundador do projeto. A sensação que dá é que o Heart and Soul consegue destravar cérebros maravilhosos, criando com isso um resultado musical impossível para nós chamados de seres humanos “normais”. Conhecer um pouco do processo de composição de Dean me mostrou, como músico amador, que as formas de conexão que conduzem ao processo de composição musical pode ser subvertido e, acima de tudo, não obedece nenhuma ordem. A música chamada “Fishwater”, por exemplo, surgiu de uma frase de sua mãe enquanto a família passeava na feira. Ela disse: “Dean, cuidado para não pisar na água de peixes“. Dean, além de possuir uma voz digna de Jimmy Hendrix, tem um carisma digno de grandes estrelas. Tudo feito com a honestidade inevitável de um cérebro que entende os códigos sociais de uma forma diferente. E por isso deu a sensação de que tudo que Dean fala, ele realmente quer dizer de verdade.

Ao lado de Dean estava Roberta, que ao final da apresentação distribuiu papeis e caneta para todos e pediu para que todo mundo respondesse a uma pergunta: “O que te dá medo ou te anula em relação a pessoas com necessidades especiais?”. Me soa até estranho escrever essa palavra “especiais”, já que a proposta do projeto é exatamente tratar essas pessoas e suas necessidades da mesma forma que são, exatamente iguais a de todos nós. Escrevi que tinha medo da minha ignorância em relação ao assunto. E nas respostas de Roberta percebi como estava sendo realmente ignorante em classificar todas as pessoas que nasceram com autismo ou qualquer outra síndrome, como uma pessoa só. Roberta disse que existe um espectro gigante entre as pessoas autistas e que cada uma reage de forma diferente às coisas, assim, como todos nós….novamente. O discurso de Roberta era generoso, inclusivo, e uma dica em especial deixou a todos emocionados. Uma dica simples, que foi reforçada por Dean. Ela falou: “Sou autista e muitas vezes por conta da minha condição eu ultrapasso alguns limites e acabo ofendendo as pessoas. Por isso, sempre inicio minhas conversas pedindo para que a pessoa se sinta à vontade de me dizer se foi ofendida por mim. Assim, eu consigo me desculpar ou me explicar de outra forma. Portanto, façam a mesma coisa. Pergunte se algo ofende a gente, pois ninguém é livre de errar.”

Não deveria ser assim com todo mundo?

Parabéns, Heart and Soul.

Parabéns, Dean.

Parabéns, Roberta.

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