Podcast: as novas frequências do áudio
Spotify comenta, pela primeira vez, as aquisições de duas empresas de podcast e os planos para tornar o mercado de áudio trilionário – tal qual o de vídeo
Spotify comenta, pela primeira vez, as aquisições de duas empresas de podcast e os planos para tornar o mercado de áudio trilionário – tal qual o de vídeo
Isabella Lessa
13 de março de 2019 - 8h00
O mobile tornou o vídeo onipresente. Para estar onde a audiência está, marcas e veículos lapidam cada vez mais esse tipo de conteúdo, sejam formatos curtos, longos, com pouco ou muito investimento. O smartphone e as plataformas digitais também o democratizaram, facilitando a criação da própria emissora ou simplesmente a documentação de fatos cotidianos por qualquer pessoa.
É sabido também que o público mais jovem adora vídeos, então até poderia se considerar improvável que um conteúdo sem imagens fosse capaz de seduzir os mais novos. A verdade é que isso está acontecendo: no mês passado, 44% da parcela mais jovem dos EUA, com idade entre 12 e 24 anos, consumiu algum podcast, aponta pesquisa da Edison Research.
Em 2018, o podcast cresceu 25% no país – o crescimento mais expressivo até agora – e a faixa etária que vai dos 12 aos 24 aparece como a que mais consumiu o formato, com 33% no ano passado. Parte deste salto foi impulsionado pela investida do Spotify no segmento com a compra do Gimlet Media – estúdio responsável por podcasts variados, como Crimetown, um thriller de suspense, e Science VS, que aborda assuntos variados, de identidade transgênero ao destino da soja – e da Anchor, que faz ferramentas para gravar e distribuir podcasts.
E o palco do Balroom D, o maior do Austin Convention Center, foi escolhido para os representantes das três empresas falarem juntos, pela primeira vez desde as aquisições, sobre as oportunidades dentro do mercado emergente do podcast. Tanto para o cofundador e managing director da Gimlet Media, Matt Lieber, quanto Michael Mignano, co-fundador e CEO da Anchor, a venda de suas operações para o Spotify foi um passo inevitável para conseguir atingir novos patamares em escala, qualidade de conteúdo e alcance.
Já para Dawn Ostroff, chief content officer do Spotify, o movimento representa, pela ótica dos negócios, a busca por diversificação que todos os players estão buscando. “Esperamos que seja uma forma de ajudar os anunciantes a atingir os consumidores de forma mais eficaz. E diferentes formas de conteúdo vão oferecer essa oportunidade. Se quisermos ser a maior plataforma de áudio, podcast é fundamental”, disse.
A executiva inclusive enxerga paralelos entre podcast e música: o serviço de streaming pretende replicar, nos programas de áudio, os mesmos esforços que fez junto aos ouvintes de música ao focar na experiência por meio de curadoria e descobertas de artistas. A estimativa do Spotify é a de que, em breve, mais de 20% do consumo da plataforma venha de podcasts.
Rádio, alguém ainda te ama
A relação afetiva de Lieber, da Gimlet, com o programas em áudio nasceu com o rádio. Diversas gerações podem se identificar com a história dele, que diariamente ouvia rádio no carro dos pais a caminho da escola. “Ouvia NPR todos os dias, acompanhava transmissões esportivas ao vivo e às vezes adormecia ouvindo meu programa favorito porque queria ter alguém falando comigo”, contou. De acordo com ele, o podcast é tão atraente para quem o consome fielmente pelos seguintes fatores: as pessoas querem ouvir histórias; querem aprender algo novo e, mais importante, querem companhia e sentirem-se conectados.
Na opinião de Lieber, um podcast bem-sucedido deve ter pelo menos dois desses três elementos. Mas, por trás do conteúdo, há uma logística complexa que foi o que levou Mignano a criar a Anchor. “Para tirar um podcast do papel, você tem de entender de softwares de edição, saber onde vai veiculá-lo, comprar bons equipamentos… então a Anchor elimina todo esse tempo que seria gasto no Google tentando decifrar todos esses passos”, explicou. Hoje, além de prover infraestrutura aos criadores de conteúdo, a empresa oferece ferramentas de analytics e está trabalhando em outras inovações.
Dawn compara a compra das duas empresas à aquisição da Pixar pela Disney, anos atrás. “Vamos deixá-los fazendo o que fazem de melhor, sem muitas interferências”, disse. Para ela, que já trabalhou com cinema, o storytelling do podcast é capaz de criar uma relação muito íntima e existe, portanto, a possibilidade de explorar muitos gêneros que até agora não foram explorados. “A missão do Spotify é conectar criadores a usuários do mundo inteiro. Expandir e aprofundar, essa é nossa ideia”, comentou.
Manuais de áudio
Do ponto de vista comercial, Gimlet e Anchor, que já têm anunciantes fortes em suas plataformas, miram em anúncios capazes de compor com a experiência do podcast, mas estão em um processo de descoberta. “Nossa audiência na faixa dos 30 anos às vezes pula nossos anúncios e entendemos isso. Afinal, na Amazon e no Netflix mais da metade desse público usa ad blockers. As marcas precisam de estratégia de áudio”, avaliou Lieber. Na opinião de Mignano, se o podcast for nichado, um bom caminho é o modelo de apoio do ouvinte, basicamente por meio de doações via Apple e Google Pay. Para as grandes marcas, uma solução viável seria adotar manuais para áudio para estabelecerem suas identidades de comunicação no podcast.
Um outro passo determinante para a ascensão da “segunda idade dourada do áudio” (nome que leva o painel) é entender o comportamento da audiência. Nesse sentido, afirmou Dawn, o Spotify precisa se equiparar ao Netflix na habilidade em decifrar o comportamento da audiência e o que ela quer.
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