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Por que a tecnologia ressignificará nossa relação com a comida?

Papel social da alimentação ganha novos contornos com o surgimento de aplicações de personalização de dietas e com a fragmentação da indústria alimentícia

Karina Balan Julio
13 de março de 2019 - 23h01

Chef Autônomo da Moley Roboctics. Foto: Reprodução

Uma das atividades mais prazerosas da experiência humana, o ato de comer sempre esteve relacionado à sobrevivência e à socialização. Na era do propósito e da customização pela tecnologia, porém, a comida ganha uma carga utilitária adicional, ideia que permeou alguns painéis da programação de Food do SXSW nesta quarta-feira, 13.

Especialistas argumentam que a relação da humanidade com a comida vai mudar a nível prático e filosófico à medida em que surgem novos alimentos de laboratório, plantações geridas por softwares, wearables de monitoramento nutricional e novas coalizões setoriais, que se propõem a mudar práticas de produção e fornecimento de alimentos.

Empresas calcadas em machine learning, como as startups Nutrino, Habit e Lumen, já fazem uso de wearables e plataformas para monitorar a alimentação de usuários e sugerir dietas individualizadas que possam aumentar a expectativa de vida das pessoas. Outras empresas, como a Moley Robotics, querem escalar cozinhas inteligentes que preparam diferentes pratos de forma autônoma e sob demanda.

Max Elder, líder da divisão de alimentação do Institute for the Future, acredita que a tecnologia irá intermediar cada vez mais o nosso consumo de comida para nos induzir a fazer escolhas mais saudáveis. “Por outro lado, sou muito cético com a ideia de que precisamos de comida personalizada. A verdade é que humanos não precisam de inteligência artificial ou de planos alimentares super sofisticados para serem mais saudáveis, só precisam de mais frutas e legumes e algum exercício”, pondera, argumentando que há maiores desafios para a indústria atualmente, como os desertos de comida e altas taxas de obesidade.

De forma geral, especialistas acham difícil que a indústria alimentícia seja automatizada em larga escala, principalmente nos pontos de contato direto com o consumidor, onde as refeições fazem parte da rotina social das pessoas. “O ato social de compartilhar a comida com a família e amigos, e de repassar o conhecimento cultural de receitas entre gerações, será muito difícil de replicar”, exemplificou Henry Gordon Smith, da Agriculture Consulting.

Comida como identidade e propósito

Para o professor Art Markman, PhD em psicologia e marketing da Universidade do Texas, a alimentação está cada vez mais conectada a valores pessoais dos consumidores, o que justifica a busca de parte dos consumidores por alimentos locais e com menor impacto ambiental. “Comer faz parte da identidade das pessoas”, afirma.

A nível macro, a indústria alimentícia terá o desafio de, daqui a 30 anos, alimentar a cerca de 10 bilhões de pessoas, contingente que exigirá um aumento de pelo menos 25% na produção de alimentos. Do ponto de vista de distribuição e acessibilidade, esta demanda tende a ser suprida por produtos com novas fontes de proteína além da carne – como proteínas à base de plantas e até mesmo insetos -; novas soluções de embalagens comestíveis, para evitar o lixo; e novos métodos de cultivo.

As aquisições no setor de bebidas e alimentos nos últimos anos dão uma pequena dimensão do potencial de inovação do setor. Apenas em 2017, foram concretizadas mais de 500 aquisições globalmente, de acordo com o The Food Institute.

Indústria fragmentada

A busca dos players alimentícios por práticas voltadas para a saudabilidade, transparência e sustentabilidade, nos Estados Unidos, tem feito com que algumas das principais fabricantes de industrializados deixem um dos maiores grupos lobistas do setor, a Grocery Manufacturers Association (GMA). Nos últimos anos, marcas como Unilever, Danone, Nestlé e Mars se desassociaram da entidade, cujos interesses deixaram de condizer com suas perspectivas para o futuro da alimentação.

Em julho do ano passado, estas mesmas empresas lançaram outra associação, a Sustainable Food Policy Alliance (SFPA). A entidade tem o objetivo de pressionar o governo americano e outras fabricantes a se comprometerem, por exemplo, com a diminuição de gases do efeito estufa e com a rotulagem responsável de produtos.

“Nosso framework é pautado em transparência junto ao consumidor, segurança alimentar, sustentabilidade e mudanças sistêmicas na cadeia de alimentos. Existe muito valor em unir grandes empresas do segmento, pois assim você tem mais chance de mudar o modelo vigente”, explicou Tina Owens, diretora de agricultura para a Danone North America, durante um painel sobre o futuro das grandes empresas alimentícias.

Ela também é a favor do maior engajamento das corporações com fazendeiros e produtores agroecológicos, além da divulgação de pesquisas junto ao público.

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