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That 70’s city: a história de Austin

Filha da eclosão cultural dos anos 1970, Austin se mantém um polo artístico unindo novidade, diversidade e tradição

Thaís Monteiro
9 de março de 2022 - 6h00

Pioneira, barroca, vanguardista, diferentona. Se este meme não estivesse “tão 2016”, seria uma boa forma de brincar com as qualidades mais essenciais de Austin, a capital do Texas e sede do South by Southwest, festival de inovação sediado por lá. Mas não, descrever a cidade como algo que beira passado pode ser algo pessoalmente ofensivo. Austin se orgulha do seu caráter de novidade, modo de funcionamento excêntrico e altamente cultural.

Cidade tem se tornado hub de inovação e casa para grandes empresas (Crédito: Roschetzky Photography/Shutterstock)

Para Natasha Louckevitch, co-diretora do Austin Jewish Film Festival e produtora executiva sênior da David Miami, a formação desse caráter descolado e eclético  é resultado de “uma árvore genealógica muito maluca”. De fato, Austin é uma união de tribos nativo-americanas com espanhóis que se estabeleceram na área no final do século XVII durante missões temporárias, imigrantes da Alemanha, Suécia e do México e, mais recentemente, da Ásia. Tamanha diversidade resultou na formação de grupos que encontraram no local espaço para expressar sua história e manter tradições acolhidas na região. 

Em Austin, é possível encontrar americanos nativos, mexicanos, asiáticos, africanos, europeus, sul americanos, da América Central, árabes e judeus. Todos convivendo de forma harmoniosa, segundo o residente Ary Filgueiras, digital marketing manager da Cyber Security e e customer & digital support for social media client na Accenture. “São pessoas diferentes trocando experiências, impulsionadas pelo crescimento do polo tecnológico da cidade. E uma característica marcante desta influência é o perfil das empresas de tecnologias, que já nascem como negócios internacionais utilizando-se deste capital humano diverso, agregando língua e cultura de diversas parte do mundo em suas culturas empresariais. Há uma necessidade desta diversidade neste negócio, entender as culturas os hábitos e comportamentos para prover soluções adequadas para todo o mundo”, descreve.

Elon Musk, o dono da Tesla se mudou para o Texas — se tornando o residente mais rico do estado — e anunciou a mudança de sua sede de Palo Alto, no norte da Califórnia, para o condado de Travis County, do qual Austin faz parte, para uma área de 2.100 acres. No final de 2021, a Samsung elegeu a cidade de Taylor, que fica há menos de uma hora de Austin, para residir sua nova fábrica de US$ 17 bilhões, que realizará a fabricação de chips avançados. Outras empresas, como Google, Facebook, Oracle, Dropbox e outras tantas tem escritórios com um grande número de funcionários alocados na cidade.

Culturalmente, a capital começou a ganhar atenção nacional nos anos 1970, quando músicos do estado começaram a frequentar a capital devido a grande quantidade de jovens, principalmente da Universidade do Texas, interessados em novos tipos de sons experimentais. “Ela teve muita influência na constituição de Austin como um polo cultural ao atrair para Austin estudantes de todo o lugar do mundo. Depois, o próprio SXSW deu uma injeção de cultura na cidade com a concepção do evento em divulgar esta característica multicultural e tecnológica para o mundo. Essa influência cultural estrangeira agregou muito para a cidade”, coloca Ary.

Um dos grandes nomes que chegou em Austin nessa leva, em 1971, foi Willie Nelson. Natural de Abbot, no Texas, ao se mudar para Austin e presenciar a cena cultural da capital, Willie decidiu voltar de sua aposentadoria. Cléver Cardoso, fundador da produtora Granada Filmes, que realizou trabalhos em Austin voltados para a cena musical da cidade, evoca o músico Willie Nelson para descrever Austin. “Ele sintetizou a fusão do country com os hippies quando mudou para lá. Segundo meus amigos da cidade, foi a primeira vez que você via hippies e rednecks interagindo num mesmo lugar, a tradição do Texas e a modernidade juntas”, coloca. Hoje o músico tem uma estátua em sua homenagem na capital.

“Música é o que começou a festa em Austin. Ao longo dos anos 1960 a área era basicamente uma cidade bem pequena e até sonolenta com 250 mil pessoas. A sua economia era centrada no governo”, conta Fred Schmidt, co-fundador e CEO da Wild About Music, uma loja de 30 anos em Austin que reúne obras de artistas locais, instrumentos e colecionáveis de amantes de música. Um dos epicentros da efervescência musical da capital é a 6th Street, rua de bares e restaurantes com música ao vivo. Outros locais de destaque é o Zilker Park, onde é realizado o festival de música Austin City Limits e a estátua de Stevie Ray Vaughan, grande nome do blues; os bares The White Horse e Broken Spoke, que contam com uma pista de dança country com coreografia; e o Continental Club, de blues. Esses sediaram shows de Willie Nelson, Johnny Cash, Conway Twitty e outros.

Assim como na música, Austin teve sua essência capturada em filmes e séries muito influenciada por diretores que escolheram a capital como sua morada, como Terrence Malick, Richard Linklater e Robert Rodriguez. Seguindo o mote “Keep Austin Weird”, Terrence Malick se aproveita de talentos locais ao contratar alunos da Universidade do Texas para trabalhar em suas produções, diz Cléver.

Algumas produções que têm Austin como cenário são Gilbert Grape – Aprendiz de sonhador (1994), Miss Simpatia (2001), À Prova de Morte (2010), Sin City – A Cidade do Pecado (2005), Boyhood (2014) e outros. “Austin está rapidamente se tornando o terceiro polo de cinema nos Estados Unidos. É um dos principais destinos de filmes independentes e de grande orçamento, além de produções de comerciais e de televisão. Além disso, Austin é cercada por pequenas cidades americanas que o tempo esqueceu, perfeito para filmes de época” conta Natasha.

Até a culinária da cidade carrega um toque alternativo. Segundo o publicitário Alvaro Esteves, diretor de planejamento da Cultura Brasil em Austin, organização dedicada a cultivar comunidade brasileiras na capital, os hippies que migraram da Califórnia nos anos 1970 tiveram influência sobre uma atividade econômica importante para a cidade que é a universo dos produtos orgânicos e naturais e influenciaram o desenvolvimento de outro ícone da cidade, os food trucks. Os pratos têm forte presença de pimenta, abacate  e coentro e os bares, até por conta de seu apelo musical, são atrações. Alguns dos pontos turísticos são o Franklin Barbecue, de churrasco texano, e o Torchy’s Tacos, restaurante mexicano que conta com um menu secreto que o cliente deve insistir para ver.

Para Alvaro, os hippies talvez também tenham influenciado escritores locais que tem uma comunidade unida e atuante. A Biblioteca Central da capital é um recorrente ponto nas listas de “locais para visitar em Austin”. Inaugurada em 2017, o prédio já foi eleito pela Time como um dos melhores locais do mundo e é uma reunião de galeria de arte, espaço para eventos, jardim e um centro com tecnologias de última geração para visitantes testarem. Esteves destaca a livraria BookPeople, que tem um calendário de “noites de autógrafos” e ilustra a relevância dos autores locais, e o Mozart Café, point dos estudantes da Universidade do Texas à beira do Lake Austin. 

Na parte artística, além da própria biblioteca, Austin tem espaços que ressaltam seu lado “estranho”, como a Cathedral of Junk, uma instalação artística feita de uma série de objetos descartados pelo artista Vince Hannemann em seu quintal, e o Museum of Weird, um museu de objetos peculiares, para não dizer esquisitos, achados pela capital por um casal fascinado por bizarrices.

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