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Peter de Albuquerque, da Ambev: “Criatividade não existe sem cultura”

Estreando no SXSW, o head de cultura e criatividade da Ambev fala sobre a diversidade do festival, o posicionamento social e político dos painelistas, e sobre sua nova missão profissional

Amanda Schnaider
16 de março de 2022 - 8h00

Peter de Albuquerque (Crédito: Amanda Schnaider)

Em sua primeira visita ao South by Southwest, Peter de Albuquerque, head de cultura e criatividade na Ambev, já notou o caráter plural e diverso do evento e da cidade de Austin, porém enfatiza que essa pluralidade ainda pode ser maior entre a delegação brasileira. “A cidade de Austin é muito plural, o evento pode ainda portar mais pluralidade, e o Brasil pode se tornar o país exemplo de pluralidade enquanto representações”, diz.

Em entrevista ao Meio & Mensagem, o executivo comenta sobre suas primeiras impressões no festival e o que vai levar para sua experiência profissional, sobre o posicionamento dos painelistas a respeito das políticas texanas em relação às crianças transgêneros no estado, e sobre o seu novo cargo na Ambev.

Meio & Mensagem – No seu primeiro texto para o blog do SXSW no Meio & Mensagem, você questionou o slogan da cidade e o que ele representa. O festival cumpre o que essa ideia promete e a que você tem em mente?

Peter de Albuquerque – O conceito de estranho me parece muito enraizado no conceito do evento. Eu consigo perceber como algo genuíno. Contudo, como eu me coloquei como um estranho dentro dessa perspectiva, é claro que vou ter umas percepções muito particulares. Quando penso no South by Southwest como um todo, consigo compreender a intenção deles de trazerem novos discursos e ideias disruptivas. E trago como pontos altos a participação do Dario Calmese e da Lizzo, que redesenhou a expectativa do que um keynote pode ser. Ela traz um keynote com uma abordagem muito humanizada, informal e baseada na oralidade. Isso, por exemplo, é  um dos fundamentos de muitas das histórias negras na História. A forma de se contar a história que atravessa a sua própria história para a coletividade. Então, vejo que a Lizzo trouxe isso com muita coragem e autenticidade. Contudo, um aspecto que ainda me impressiona é quando eu penso nas delegações brasileiras. Nós somos a segunda maior delegação, e quando estou entre brasileiros ainda percebo que as pessoas negras, por exemplo, ainda são uma muito pontuada exceção. E isso é um ponto de importante reflexão para todos nós. Contudo, ainda sim, existem possíveis protagonismos ao brasileiro e ao Brasil e às ideias brasileiras no evento. Gostaria até de destacar inclusive a participação da Ambev no painel do dia 12, com o Rodrigo Moccia e a Bettina Grajcer trazendo, por exemplo, o consumo moderado e a promoção da saúde enquanto norte de reflexão. Tem um lugar muito inovador nas propostas de algumas palestras brasileiras como essa, por exemplo, mas eu ainda sinto que podemos caminhar para mais pluralidade. Eu gostaria de ver o Brasil, que é um país tão numericamente representativo, ser igualmente representado aqui. Faço essas duas leituras, a primeira do evento como um todo, que ele tem, sim, pluralidade e uma teia muito diversa de ideias, culturas e essências, e quando eu vejo as delegações brasileiras como um todo, ainda sinto que o Brasil não absorveu a potência que poderia construir com mais novas representações. Fico muito orgulhoso também de estar em nome da Ambev, junto com a Renata Hilario. Nós dois somos duas lideranças que a meu ver aportam para esse lugar novo. Fico muito orgulhoso de ver a Ambev trazendo nomes plurais para representar o South by Southwest. Existe potencial diversidade no evento, existe muita pluralidade, mas também existe muita pluralidade na cidade de Austin. O evento pode ainda portar mais pluralidade e o Brasil pode se tornar o país exemplo de pluralidade enquanto representações. 

M&M – Quais são os principais aprendizados que vai levar do SXSW para o seu dia a dia de trabalho e para a sua vida?

Albuquerque – Eu tenho refletido muito sobre o quão transversal a criatividade pode ser. A missão da minha cadeira como head de cultura e criatividade é também nessa direção de criar uma “agenda” de cultura e criatividade que consigam não ser só assuntos específicos, mas nortes e bases para todas as outras competências e missões da companhia. O South by Southwest faz isso e é muito espetacular, ele atravessa a criatividade em todas as frentes, e essa é a única linearidade do evento, é a criatividade e a cultura. É o grande ponto em comum. Então, apesar da termos diferentes provocações em experiências de marca, em painéis, em shows, existe essa única linearidade do evento, que é a cultura e a criatividade. Saio desse evento mais fortalecido nesse entendimento e também muito grato de viver um momento do mercado e da companhia em que estou, a Ambev, com a liderança do Daniel Wakswaser e da Paula Guz, na Draftline, que permitem e que também acreditam que a criatividade não é um assunto específico, é uma base e um solo que norteia todos os saberes e entregas dentro do mercado.

M&M – Como membro da comunidade LGBTQIA+, qual é sua opinião a respeito da atitude do Governador do Texas em relação às crianças transgêneros? Alguns palestrantes estão se posicionando. Essa atitude é suficiente ou precisa de ações mais afirmativas?

Albuquerque – Vivemos num momento no qual mesmo enquanto porta-vozes, enquanto marcas, enquanto companhias, se torna inevitável colocar alguns posicionamentos. E eu admiro a coragem e consigo ter empatia pelo desafio que é ser um grande palestrante, num evento como esse, e não concordar com as políticas do estado. Me sinto representado pelos painelistas que se colocaram explicitamente contra as políticas texanas. É impossível descolar o pensamento de inovação do contexto e do presente. Esse descolamento é utópico. Então, quando um speaker está se posicionando sobre algo que é do contexto vigente, do momento presente, e da terra onde estamos, do território onde estamos, hoje,  colocando nossos pés, é muito importante. Também fiquei muito tocado em ver pessoas que são, inclusive, do Texas, que têm histórias no Texas, também se colocando contra isso como, por exemplo, a Brené Brown, que é também uma grande pensadora, é texana e também se colocou contra essas políticas, a Lizzo também se colocou contra. Acredito que é o momento no qual se torna inevitável demarcarmos ideologias que falem sobre o direito básico dos seres humanos e dos cidadãos, incluindo pessoas trans que são fundamentais na sociedade. 

M&M – Falando um pouco mais sobre sua carreira, há cerca de um mês, você mudou de cargo na Ambev se tornando Head de Cultura e Criatividade. O que essa mudança representa para você? 

Albuquerque – Essa mudança representa o papel da representação. É até intencionalmente circular essa frase. Essa mudança representa um lugar de trazer novos autores para a construção de histórias. A criatividade no mercado aporta a responsabilidade de contar as histórias, as narrativas são construídas a partir da criatividade e nós precisamos de muitas lideranças plurais e diversas, que tragam consigo vivências e perspectivas em primeira pessoa para que consigamos densificar o que o marketing conta enquanto história, hoje, no mercado, no Brasil e no mundo. E eu espero que, não só esse meu cargo, como outros cargos que também têm se movimentado dentro do mercado possam servir não como pontos isolados, não como exceções, mas como a construção de novas regras e de novos modelos plurais e genuínos de negócios e de protagonismos. Eu tenho recebido, por parte das minhas lideranças, a Paula Guz, que é a head de marketing e transformation do Draftline, que é a nossa agência in-house, e também do vice-presidente de marketing Daniel Wakswaser, extrema liberdade, propositiva e criativa para acelerar as transformações que eu acredito. Tenho tido amplo suporte. Não tem como ter uma agenda como a que eu tenho hoje sem ter apoio das lideranças. É muito além de colocar um líder num novo cargo, é preciso construir um ecossistema de acolhimento e de fortalecimento para que esses novos nomes se sintam confortáveis para proporem o novo e a transformação que o mundo precisa, que o hoje e que o amanhã tanto precisam.

M&M – Qual é a importância de ligar a criatividade à cultura?

Albuquerque – Na verdade, agora vivemos o resgate do encontro que sempre deveria ter ocorrido e que agora se coloca explícito. Cultura não existe sem criatividade, criatividade não existe sem cultura. Integrar essas palavras é finalmente criar coesão estratégica, coesão criativa, coesão em comunicação, não só pensando em marketing, mas pensando em sociedade, pensando em histórias. O momento pede essa integração. Quando pensamos em branding, marcas, empresas são como corpos e precisamos ter esses membros todos integrados num só corpo. Não tem como haver um corpo que não tenha criatividade e cultura, conectados. Isso é muito importante para que transmitamos a verdade, mais do que transmitamos a verdade, para que sejamos a verdade e assim transmitamos a verdade. 

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